Um dos mais representativos espaços de preservação da religiosidade afro-brasileira em Salvador, o Ilé Iyá Omi Àse Iyamasé, popularmente conhecido como Terreiro do Gantois, recebeu, nesta sexta-feira (29), o Centro Comunitário Mãe Carmen, dentro da programação de entregas da Prefeitura que marcam o aniversário de 470 anos de Salvador. A cerimônia de inauguração contou com as presenças do prefeito ACM Neto, do vice-prefeito e secretário de Infraestrutura Obras Públicas, Bruno Reis, além da ialorixá Mãe Carmen e lideranças do centro religioso.

"Temos aqui um grande desejo realizado. Fazemos o possível para a comunidade. Mas esse é o ponto alto, e me deixa felicíssima. Espero que funcione tão bem quanto a cidade, e que Olorum nos ilumine sempre. Quem trabalha para esta cidade só tem luz, sempre", abençoou Mãe Carmen. 

A estrutura dará suporte aos projetos sociais que já ocorrem na casa, ampliando o atendimento à população do bairro e localidades adjacentes. O centro comunitário leva o mesmo nome da líder do templo religioso e foi projetado pela Fundação Mário Leal Ferreira (FMLF). Para as obras, foram investidos R$ 886.308,16.

A unidade possui um salão com capacidade para 50 pessoas no primeiro andar, uma sala para cursos, uma sala para percussão e leitura e um consultório médico. Conta com divisórias que podem ser instaladas ou removidas conforme a necessidade de ampliação de espaço para eventos. Também foram implantados sistema elétrico, telefônico, de esgoto e águas pluviais, além de equipamentos de segurança contra incêndio e paisagismo.

"O Gantois é um dos terreiros mais importantes do Brasil, um espaço da fé, que conta com a liderança extraordinária de Mãe Carmen. A Prefeitura, enxergando também a importância turística e histórica do Gantois, decidiu construir este centro comunitário que vai servir à comunidade e ser um espaço atrativo para turistas do mundo inteiro, que vem atrás deste axé extraordinário deste local", destacou ACM Neto. 

História

Os terreiros de candomblé são lugares de transmissão de conhecimentos religiosos, de preservação de memórias ancestrais e das línguas africanas. Um dos mais importantes do país, o Terreiro do Gantois se constituiu ao longo do século como um espaço sagrado de longa expressão religiosa, mantendo os costumes e os legados milenares dos povos Iorubá (Abeokutá).

O santuário foi fundado em 1849 pela africana Maria Júlia da Conceição Nazareth e preserva o culto aos orixás, seguindo uma tradição matriarcal com base na estrutura familiar de manutenção dos laços parentais - ou seja, é comandado por uma Ialorixá (sacerdotisa), cargo máximo ocupado apenas por mulheres iniciadas e que tenham laços de parentesco com as fundadoras. A escolha da sucessora se dá, após a morte da mãe, por meio de um rito de consulta aos orixás, através do jogo de búzios.

Já assumiram as ialorixás Maria Júlia da Conceição Nazareth; Pulchéria Maria da Conceição Nazareth, ou Pulchéria de Oxóssi; Maria da Glória Nazareth; Maria Escolástica da Conceição Nazaré, conhecida como Mãe Menininha do Gantois, que presidiu a casa por 60 anos e ganhou reconhecimento e destaque como uma das lideranças religiosas mais importantes do paí;, e Cleusa Millet (filha de Mãe Menininha). A atual sacerdotisa é Carmen Oliveira, a Mãe Carmen do Gantois, que assumiu o trono desde 2002.

O Terreiro do Gantois ocupa uma área de cerca de 3.600 m², entre a parte cumeada do morro e o vale, e sempre esteve aberta para receber gente de todas as origens e classes sociais. O nome africano da casa (Ilê Axé Iyá Omin Iyamassê) faz alusão a uma divindade feminina, senhora das águas. Já o nome popular refere-se ao antigo proprietário do terreno onde está estabelecido o terreiro, o traficante de escravos belga Édouard Gantois.

Na parte alta, o templo principal é formado por salão de festas públicas, clausura, cozinha sagrada, sala-refeitório, vestuário e cômodos residenciais. Como anexo ao templo, há o Memorial Mãe Menininha do Gantois, além de santuários de Omolu, Ogum e Exu. Há ainda uma gameleira sagrada associada a Iroko e uma jaqueira sagrada dedicada a Ogum. Na encosta há uma vegetação densa onde há plantas utilizadas nos rituais, um santuário para Oxum, uma fonte e residências de membros da comunidade de culto. 

O terreiro foi reconhecido como Área de Proteção Cultural e Paisagística pela Prefeitura Municipal de Salvador, através da lei nº 3.590 de 16/12/1985, e tombado pelo Iphan como Patrimônio Histórico e Etnográfico do Brasil, via portaria nº 683 de 17/12/2002.